Pela
primeira vez, uma equipa de cientistas nos EUA, liderada por um investigador
português, comparou várias maneiras, tanto subjectivas como objectivas, de
“medir” a influência dos filmes de Hollywood. E conclui, na última edição da
revista Proceedings of the National Academy of Sciences(PNAS),
que a melhor maneira de saber se um filme ficará na história não passa pela
opinião dos críticos, mas… por um programa informático que conta o número de
vezes que esse filme continua a ser referenciado, citado, por filmes
ulteriores, muitos anos mais tarde.
“Os críticos de cinema
podem ser demasiado peremptórios a declarar a grandeza de uma obra – e são
tendenciosos”, diz em comunicado Luís Amaral, especialista português de redes
e sistemas complexos, radicado nos EUA, onde trabalha há mais de dez anos
na Universidade Northwestern. “O nosso método não podia ser mais objectivo.”
Os
investigadores realizaram um estudo de milhares de filmes norte-americanos
listados no célebre site IMDb
(Internet Movie Database). Estabeleceram assim uma lista dos filmes mais influentes
segundo um critério por eles determinado. A seguir, compararam os seus
resultados com o Registo Nacional de Filmes (NFR), uma lista criada em 1988
pelo Conselho Nacional de Preservação dos Filmes dos EUA (o National Film
Preservation Board, que depende da Biblioteca do Congresso). Essa lista, que
contém actualmente 625 obras “de importância duradoura para a cultura
americana”, é actualizada anualmente através de “uma cuidada avaliação e
deliberação”, escrevem os autores na PNAS. Os filmes elegíveis
devem ter pelo menos dez anos de idade e ser considerados “cultural,
histórica ou esteticamente significativos”. A presença de um filme no NFR
atesta assim, da forma mais fiável possível, “do impacto, da influência, da
importância das obras de criação” que são os filmes, salientam.
Em
que consistiu a análise que eles próprios fizeram? Acontece que, pelo seu lado,
o IMDb lista, para cada filme, numa rubrica intitulada “ligações” (connections), links para outros filmes
que, de uma maneira ou outra, façam alusão a esse filme (trata-se de dados
obtidos através do contributo dos utilizadores do site).
“Existe
uma ligação entre dois filmes quando uma sequência, uma personagem ou um qualquer
outro elemento do filme referenciado foi adoptada, utilizada ou imitada no
filme que faz a referência”, explicam os autores. O nível de pormenor atingido
pode ser estonteante, como o mostra um dos exemplos dados pelos cientistas: a
ligação entre o filme Arizona
Júnior, de 1987, e A
Noite dos Mortos-Vivos, de 1981, deve-se ao facto de os seus
respectivos protagonistas guiarem um carro Oldsmobile Delta 88.
Com
base neste manancial de dados, a equipa construiu uma rede de ligações entre
15.425 filmes, ligados por 42.794 citações. Nesta abordagem, a importância de
cada filme é representada pelo número de filmes que o citam, tal como o impacto
de um artigo científico é avaliado através do número de outros artigos
científicos que o mencionam.
Como
“medida” da importância dos filmes vista pelo prisma dos críticos de cinema, os
cientistas utilizaram, em particular, a nota atribuída aos filmes pelosite Metacritics, que é
calculada com base em múltiplas críticas publicadas sobre esse filme. Por
último, para quantificar a opinião do público, recorreram aos votos do público
registados, mais uma vez, no IMDb.
Resultado:
a contagem do número de citações de um dado filme por outros filmes é o método
mais fiável para prever a presença desse filme no Registo Nacional de Filmes –
e em particular, quando esse filme tem 25 anos ou mais. Ou seja, são as
citações de um filme presentes noutros filmes ao longo de muitos anos que
melhor atestam da sua “grandeza”.
“A
nossa análise mostra que a contagem das citações associadas aos maiores
intervalos de tempo [entre o filme citado e o filme que cita] são o factor que
melhor permite prever a presença de um filme no NFR”, concluem os cientistas.
Entre os filmes que possuem uma história particularmente longa de citações – e
que constam, de facto, do referido registo – estão O Feiticeiro de Oz, A Guerra das Estrelas, Psico, Casablanca e Tudo o Vento Levou. “Os
cineastas estão sempre a regressar aos filmes importantes”, diz Luís Amaral.
“A
importância de um filme não é uma componente visível, mas existem coisas que
conseguimos medir, tais como as notas dos críticos, o número de prémios ou de
citações por outros realizadores – e que dão pistas acerca dessa componente
escondida", acrescenta o investigador. "E, em última análise, o que
vemos é que não são os críticos, mas os criadores, os próprios realizadores,
que vão determinar quais são os filmes realmente importantes.” Quem
decide de forma fiável se uma obra de cinema passará ou não à posteridade
também não são, já agora, nem os Óscares nem Cannes ou outros prestigiados
festivais internacionais.
Fonte: http://www.publico.pt/ciencia/noticia/matematica-melhor-do-que-criticos-a-identificar-filmes-memoraveis-1682801
Nenhum comentário:
Postar um comentário